[Já que o assunto é Sinfonia de Cães, eis o dia em que fizemos contato de 1º grau com a rapaziada. Originalmente publicado na finada edição online do Gasosa Improvisada].
Quando fiquei sabendo do festival Sinfonia de Cães, achei que era um blefe. Um festival com Hurtmold, Ludovic, The Concept e mais oito bandas com entrada a R$10 [quase de graça]. Tudo pra ser a melhor pajelança rock do ano. O melhor é que o pico aconteceu num lugar muito fácil de chegar, ao lado do estádio do Canindé. Perfeito para a trupe caipira que percorreu 260km no busão da Pássaro Marrom e enfrentou uma friaca de uns 5 graus celsius na volta por puro amor ao rock.
Como não sei se vou conseguir descrever com fidelidade o que eu gostaria de expressar [porque o conhaque também apaga alguns detalhes da nossa mente de vez em quando], vou apelar para o sistema nerd de notas aos shows, sob critérios absurdamente subjetivos e vocês interpretem a partir daí. Mas não esperem um pingo de racionalidade, ok? Tão avisados.
Prevista para durar doze horas, a "rave" começou por volta das 19h00 com o THE ROYAL SHAKERS, projeto paralelo de Marco Butcher, do Thee Butchers Orchestra. Basicamente blues cru e distorcido, com percussão mínima, só bumbo e pandeiro pouco utilizados. Para os fãs de som de garagem, deve agradar bastante. Nota sete.
Em seguida veio o HURTMOLD. Esse era o primeiro dos shows imperdíveis da noite - para mim ao menos. Viagens sonoras, MPB com jazz, vanguarda paulistana, clima de jam session. Som para estados alterados da mente. Pretensioso? Sim, mas os caras são bons pra caralho. Contanto que essa pretensão não influa nos rumos da banda, vão construir uma história linda. Nota dez. Tudo muito bom até aí, mas o rock só começou mesmo com a primeira banda "da casa" [formada por integrantes da "Sinfonia"], o WASTED NATION, que fez jus ao ótimo nome promovendo a discórdia num show tosco e engraçado pra caralho. O contraponto total ao perfeccionismo do Hurtmold. E o guitarrista tinha o melhor visu da noite: camiseta do Mahatma Gandhi, kilt, All Star botinha e mullets. Mestre! Nota sete e meio.
Na sequência, LUDOVIC. Quem já viu o show conhece o estupro sonoro que se instala nos poucos minutos de apresentação [uns 25 minutos] desses caras. E é óbvio que não foi diferente dessa vez. Nem a queda de energia no meio de "CVV" [O ESPAÇO DO BAIXO E VIL!!! AAAHHH!!!] cortou o clima de insanidade, culminando com Jair caindo no meio de todo mundo em "Vane, Vane, Vane". Nota dez, claro. Problema seria para a banda que entrasse depois, que teria uma responsa filha da puta pra segurar. O que não foi problema para o power trio POPSTARS ACID KILLERS, segunda banda a se apresentar formada por "cães" e disparada a melhor surpresa da noite. Um showzaço, rock and roll básico gritado, sujo e direto, sem frescuras, daqueles que a gente gosta de ver e ouvir. É uma banda que você REALMENTE PRECISA ver ao vivo. Nota dez também neles!
A seguir mais um power trio, o DETETIVES, banda ansiosamente aguardada por meu companheiro de viagem e colega de Gasosa Fábio "Gordinho" Figueira. De início, uma surpresa negativa: o baixista não foi ao show "porque ficou preso por porte de drogas em Porto Alegre", brincou o vocalista Alejandro, tirando uma onda com o galã global e maconheiro Marcelo Anthony. O que inicialmente anunciava-se como uma catástrofe, acabou se tornando uma das maiores demonstrações de "foda-se" que eu já vi. Os dois detetives restantes tiveram peito de encarar o palco só com guitarra e batera - e ainda conseguiram promover a quebradeira. Claro que com o baixo seria melhor, mas show assim é coisa de quem tem três. Nota nove pelo colhão.
Depois de uma pausa de meia hora para refresco, veio o fiasco [como diria Júlio Cavalcanti] do festival: BIÔNICA. Peço desculpas aos integrantes da banda, mas pelamordeneilyoung, as músicas são uma merda. Eu juro que tentei gostar, mas não deu. [Aliás, acho que nem o Bola ia gostar dessa*]. É o tipo de banda que todo ser humano deveria odiar: visual retrô-modernoso e um som raquítico, fraco. Disseram a mim que a banda era melhor quando a vocalista fazia fio-terra no guitarrista no meio do show. Imagino. Nota um. Na sequência veio a terceira banda da casa canina, o VINCEBUZ [pronuncia-se "vincêbuz"]. E o negócio deles é barulho, gritaria, sandice, submundo, mais barulho, liquidificador sonoro e o caralho. Aqui aconteceu o momento mais hilário de todo o festival: um figura subiu ao palco para dançar trajando apenas uma calcinha do Placebo. Como diz a música "Limbose", é o fim do mundo! Único porém do show dos caras: foi muito longo [consideremos que antes vieram sete bandas]. Deveria ter umas três músicas a menos. Nota sete.
Um misto quente e uma coca-cola depois, veio a veterana THE CONCEPT, que periga ser uma das 3 melhores bandas que cantam em inglês no Brasil. Ouça "Voices That I Don't Listen", e concorde comigo: eles já têm crédito com deus quando morrerem. O show é uma viagem, maravilhoso, culminando com os dez minutos de "Please, Don't Call Me Junkie". Podia ter durado mais uns vinte que ninguém ia ligar. Nota dez.
Em seguida, tocou o BORDERLINERZ. Gostaria muito mais dessa banda se eu ainda tivesse 13 ou 14 anos, quando qualquer coisa gravada antes de 1979 virava meu disco preferido. Mas naquela época da minha vida [seis anos atrás] o hard rock 70's era uma coisa brega para os indies. Das duas, uma: ou previ a modinha ou criei pêlo no saco antes de todo mundo. Tirem suas próprias conclusões. E outra, quantas milhares de bandas vocês conhecem dessa nova safra independente que são influenciadas por [atenção para a ORDEM] Stooges, MC5, New York Dolls, Ramones, e Guns 'n' Roses? Não se agüenta mais. Mas até que o show foi competente. Nota seis.
E para fechar a noite, vieram as minas do DOMINATRIX. É estranho ver uma banda cuja baterista parece A SUA MÃE 25 ANOS MAIS JOVEM [e tocando MUITO BEM ainda por cima]. Belo show, as feministas mandam bem; já posso dizer que gosto de outra banda de hardcore além de Sub Midian [ok, Sub Midian não é hardcore, mas isso é papo pra oooutra tele-aula]. Juro que eu esperava bem menos. Nota oito.
@@@
Eu planejava no texto falar só das bandas, mas tenho que fazer algumas reclamações a fazer desse povo que diz apoiar o tal do rock independente no Brasil enquanto público. Tivemos um evento dessas proporções, que teve nota saindo na Folha de S. Paulo, num espaço muito bom para shows - no entanto não mais do que 300 pessoas compareceram ao Sinfonia. Na boa, eu esperava encontrar UM VERDADEIRO INFERNO, umas mil almas pervertidas sedentas por música, assim como acontece na porra do Hangar 110 quando vai o Dance of Days. Não tem desculpa: eu e mais uns oito cocos saímos de Taubaté [repito, andamos 260km de busão, ida e volta] só pra ver a porra do festival QUE PROMETIA E FOI DO CARALHO, e as bichas indies da capital ficaram em casa com friozinho. Ok, ninguém precisa ser fominha de rock igual a nós, mas não venham me dizer depois que gostam e/ou apóiam bandas independentes. Não é só comprar a revista do Lobão com o CD do Mombojó [só porque você leu na coluna do Lúcio Ribeiro que é legal] que vai fazer de você uma pessoa à parte do esquemão. Um pouco de atitude punk não faz mal a ninguém. Pra falar a verdade, até meu pai é muito mais punk [e ele ouve Yanni e The 101 Strings Orchestra] que esse pessoal fresco aí.
@@@
*O Bola é o cara mais tolerante com música na história do planeta. Se ele não gosta de alguma coisa, é porque é RUIM MESMO. Na verdade, até hoje só vi ele falar mal de Jota Quest, Nickelback e Creed.
Um comentário:
"bola, o prostituto musical"
Postar um comentário